terça-feira, 12 de agosto de 2008

"Chega de saudade"



Faz alguns segundos que você se foi, e tudo acabou da
exata forma que começou: Rápido, sem muitas enrrolações. Nem por isso foi menos sofrido, sentido, minhas lágrimas inundam o teclado, minhas mãos tremem digitando em busca de alívio.
Até para terminar você consegue ser correto, carinhoso, sincero. Queria enfiar minha cabeça entre as pernas e cantarolar cantigas de quando era criança. Era assim que fazia quando queria que algo passasse logo. Quando meus pais brigavam, eu me trancava no banheiro, com a cabeça entre as pernas e mãos no ouvido, cantava baixinho para não escutar os gritos desrespeitosos que ardiam meu peito e olhos. Quem dera desse certo agora.
Sinto segundos desejáveis de suicídio, vontade de pular de cima de uma montanha com o dedo desejando um último foda-se ao mundo. Nem que fosse para fazer barulho e sujar o chão dos equilibrados. Nem que fosse para fazer falta a poucas pessoas. Olhos inchados, boca cheia, coração apertando o peito, língua encharcada, a vida latejando e o corpo pesado demais para voar.
Dessa vez achei que o amor perduraria para sempre, cheguei a acreditar que casaríamos e teríamos nossa casa de tijolinhos com cerquinha branca. Você foi meu futuro marido, gostei de imaginá-lo. Meu macho de ombros largos de proteção e abraço eterno. Mãos grandes que serviram para tudo: desde atravessar a rua segura até sentir prazer sem medo das horas.
Contado dessa forma parece bem que a culpa foi sua em ter abandonado nossos sonhos, mas respeite e perdoe minha indelicadeza, às vezes gosto de me fazer de vítima, gosto do abraço que me oferecem quando fazem mal a mim, estou fugindo de olhares censurosos por isso fica mais fácil te culpar.
Ando falsa, fazida, estúpida. Quer saber? Bem que você fez, em tirar-me da sua vida. Mais cedo ou mais tarde iriam começar aparecer meus defeitos. E pode acreditar, sou cheia deles. Estou de saco cheio de me agüentar, e eu ao menos posso terminar comigo. Ou posso? Estou até a borda de mim. Entupida de tudo o que passiva em ser, apenas sou. Sou um trapo sujo que lavo e contorço todos os segundos, mas não o tanto que deveria por falta de força, preguiça e do maldito medo.
Está um escuro total, todos estão dormindo, e eu estou mais sozinha do que nunca, estou deitada sem o menor sono. Respiro fundo com a cara enfiada no travesseiro tentando encontrar um resto da nossa esperança. Por alguns segundos penso em ficar assim: com a cara enfiada sem encarar a vida e sem respirar por muito tempo. Nada é claro e esperar o dia amanhecer não vai adiantar.
Seu sorriso separado há meses do meu existe apenas em saudade e imaginação. Eu sinto um pesar de morte sobre os olhos e sempre escapa uma lágrima tentando acalmar a secura do peito. Sinto covardia lúcida ao olhar minhas pernas que não correm mais ao seu encontro. O fato é que nunca viveremos o desgaste e para sempre viveremos com a falsa impressão da perfeição, o que dói ainda mais.
Gosta de comer devagar, partindo os pedacinhos microscopicamente como se saboreasse o mundo. E gosta muito, entre outras coisas, de me comer. E me come o dia inteiro. E quando ele não me come é porque precisa respeitar minhas dores e alergias, então faz carinhos em meu cabelo. Gosta de livros logosóficos, de um bom vinho ou de uma cerveja bem gelada. Gosta também de varanda, de deitar na rede e ver a tarde se indo, sentindo o cheiro da brisa que bate o rosto.
Eu o invejo. Sempre contente com as pequenas coisas, ao contrário de mim, sempre buscando mais e mais, sempre confusa, perdida, deprimida. Quis sugar sua vida, e me perdi. Incapaz de me sentir por medo de ser inteira.
Tinha muito medo que as pessoas sem profundidade conhecessem a minha, e mais medo ainda de que a profundidade do mundo me cuspisse. Engraçado, agora temo a sua profundidade e minha superficialidade.
Duas vezes eu quase morri de saudades de você. Uma quando eu vi Closer e lembrei que o amor, como deveria, não existe. E agora quando escuto sem cansar “Chega de saudade” e lembro que você era um pedaço charmoso de tudo o que o mundo e a vida têm de mais charmoso. Dói pensar ou aceitar que esse pedaço não existe mais. Morremos, enterramos nossos sonhos, e eu choro de luto sem teatro, de luto de planos, promessas, de resto de luto do amor que ainda tenho. Acabaram-se os três pontinhos, demos o ponto final com a dureza e a clareza do fim de uma história sem final feliz.